RUA DIREITA, A PRINCIPAL RUA DO RIO COLONIAL

Uma pequena capela dedicada à Nossa Senhora do Ó, aparentemente à beira mar, ficava no meio do caminho entre o Morro do Castelo e o Morro de São Bento. Não se sabe hoje quem a construiu, apenas que foi encontrada e ocupada pelos frades carmelitas por volta de 1590. A capela foi testemunha do surgimento da principal rua do Rio de Janeiro até meados do século XIX, a antiga Rua Direita. De acordo com o historiador Brasil Gerson, ela foi assim chamada não por ser reta, mas porque mais facilmente, ou direito, se locomoviam os colonizadores entre os dois morros. Logo depois se construiu o Convento do Carmo ao lado da pequena capela, que, destruída com o tempo, deu lugar à igreja de Nossa Senhora do Carmo.

A Rua Direita foi logo no início da colonização do Rio de Janeiro ocupada em todo o seu percurso. Seu primeiro comerciante ali começou um açougue e um trapiche para pesar açúcar, um dos itens mais valiosos da colônia. Com o tempo a região recebeu a Casa dos Governadores – hoje Paço Imperial -, construída pelo conde de Bobadela, e a construção de mais duas igrejas, a de Santa Cruz dos Militares e a igreja da Ordem Terceira de Nossa Senhora do Monte Carmo.

Atravessado pela Rua Direita, o Largo do Carmo era palco de procissões religiosas e cortejos civis que saíam das respectivas igrejas. Na noite de sexta-feira da paixão, a rua era tomada de fiéis que iam iluminando o caminho com tochas; na procissão de Corpus Christi, a multidão coloria as ruas com a participação de S. Jorge. Assim também foi no casamento do imperador D. Pedro I e D. Leopoldina, filha do imperador da Áustria. Um imenso cortejo desfilou pela Rua Direita entre alas de soldados, tiros de canhões e o toque dos sinos das igrejas. A rua nessa ocasião foi coberta de flores, folhas e arcos alegóricos.

É comum reconhecer o papel de destaque da Rua do Ouvidor para a capital do império, mas ela só veio a ter grande importância a partir de meados do século XIX. A Rua Direita foi a mais importante rua da cidade por mais de três séculos. Era o coração comercial e financeiro do Rio de Janeiro, onde se instalou o primeiro Banco do Brasil, em 1808, a Alfândega e a Praça do Comércio. Além das grandes casas comerciais, a rua também ficou marcada pela sua gastronomia refinada. Espalhavam-se em sua extensão confeitarias e restaurantes de culinária europeia, principalmente francesa. Em um desses estabelecimentos, o italiano Luigi Bassini pela primeira vez produziu e comercializou sorvetes na cidade do Rio de Janeiro, alcançando grande sucesso na corte.

No dia 15 de março de 1870 aportava no Rio de Janeiro um navio inglês procedente do Paraguai. O Brasil, que estava em guerra com o país vizinho há mais de cinco anos, recebeu a tão aguardada notícia de que general López havia sido morto pelas tropas brasileiras. A guerra havia terminado no dia 1º de março. Multidões logo ocuparam o Largo do Paço, atual Praça XV, para festejar a notícia. Aclamados nas janelas do Paço Imperial, D. Pedro II e D. Teresa Cristina quebraram todos os protocolos e desceram para confraternizar com o povo. O monarca começou então uma grande passeata pela Rua Direita para comemorar a vitória. Não se sabe como e nem por quem surgiu a ideia, mas é certo que alguém sugeriu – “que ela se chame, daqui em diante, 1º de Março!”

P. G. Bertichem. Lithographia Imperial de Eduardo Rensburg Rio de Janeiro, 1856.

 

Rua Direita do Rio de Janeiro em aquarela de Thomas Ender. ACG01828. BANDEIRA, Júlio; WAGNER, Robert. Viagem ao Brasil nas aquarelas de Thomas Ender: 1817-1818. Petrópolis: Kappa Editorial, t.2, p. 405.